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segunda-feira, março 29, 2004

“Um brother maior perguntou como é que se representava o conhecimento, qual era o desenho.” (MARGUERITE DURAS)

A estrada está de um lado e tu do outro.
“Na semana passada saiu de casa ainda sob efeitos dos sedativos. A mãe encontrou-o na rua a dizer que ia até à ponte, para se atirar de lá.”
Faz sentido. Se sabes que existe o chão, para quê continuas a cair? E cais contudo.
O dia passa lento, com uma asa de xícara de chá, a ser levado à boca.
“E os médicos dizem que ele não tem nada, além da depressão e da idade.”
Gritantes, os deveres por fazer. A mochila e um caminho que não é o da escola. Os médicos dizem que ele tem a depressão e a idade. Não sabem da forma de cair.
“Disse que estava farto, que não valia a pena impedi-lo nesse dia. Outro dia seria o mesmo dia.”
Seria a mesma vontade.

“Ernesto disse: Não se pode desenhar. Porque é como um vento que não pára. Um vento que não se consegue agarrar, que não pára, um vento de palavras, de pó, não podemos representá-lo, nem escrevê-lo, nem desenhá-lo”. (MARGUERITE DURAS)

O dia passa lento. Antipirético. Sons de cordas. Violinos e gruas laranja.
A ponte. A estrada a passar por baixo. Como se não o soubesse. Outro dia seria o mesmo dia. A estrada passa lenta como se não soubesse. Da forma de cair. Lúcida e quente. Extrema.

segunda-feira, março 22, 2004

“Estás a usar a minha camisola.”
“Tens um problema com os possessivos...”
“Não... Tu é que tens um problema com que eu use os teus possessivos. Estás a usar a minha camisola.”
“Se usas os meus possessivos, eu uso a tua camisola. Como se fosse minha.”
Fechas a porta do armário azul. A força faz com que se abra outra. Fechas a outra porta do armário. Abre-se outra. Janelas azuis dentro de uma cozinha pálida a cheirar a mar. Mar alastrado. Mar sons, mar ciscos, mar sol só sumo, simples mar. Sem sódio. Mar em didascálias.
A força faz com que se abra outra. E dentro da janela o mar. O mar que falta, feito areia. Para tempero.
Ris-te. A minha camisola justa às riscas sob teu cabelo temperado. Ris-te.
E eu visto-me com o teu riso justo. Como se fosse meu.

quinta-feira, março 18, 2004

Só amamos aquilo que amamos em vão(...)"
(MIROSLAV HOLUB)

domingo, março 14, 2004

As mãos cheias de gelado.
Salto e caio. Som da pedra na nuca. Rasgou-se. Som ampliado e desfeito.
A gente corre dentro de azuís.
Não me lembro de descer as escadas. Lembro-me de serem altas. Altas como espigas.
O sol. As mãos cheias de gelado.
As nuvens cheias.
O sol espigado.
A gente agarra-me nos azuís. Segura-me a nuca.
A pedra fere como sol. Diástole de ideias.
As maõs cheias de gente.
Da gente, do gelado, da água e das linhas com que me coso.

quarta-feira, março 10, 2004

Lembras-te de quando me acompanhaste a casa e me adivinhaste zangada porque sim? Disseste: "Parte um livro ou rasga um copo" . (Ou terá sido o contrário?)
"Rasga... Parte...." Na altura tentei rasgar um copo, mas não consegui. Tinha um e condoía-me só de olhá-lo. Os livros, esses, parti-os a todos. Não sobra um. São tantas as passagens-estilhaço ou estiagens-palhaço que não tenho onde dormir senão no parapeito da janela. Brados de tempestade a acotovelarem-me.
Hoje zanguei-me de novo. Dito irrevogável. Zanguei-me. Aprendi.
Rasguei os copos.
A fórmula é fácil: acariciar até gemerem, dentro das mãos. Depois segura-se junto aos lábios entreabertos para largar no chão aberto, sem anúncio prévio. (A ausência de anúncio é fundamental!). A colisão faz com que estriem ao centro-esquerda. Depois um sopro e rasgam. Como parentisis abertos. Com sons de emissão interrompida.
Foi assim que fiz. Rasguei os copos.
A confusão foi tal quando a família chegou a casa que os sons dos copos se misturaram e entraram em combustão. Ardeu tudo. Roupa e música e escova de dentes e dicionário e atacadores.

Estou à porta com os olhos sem continuidade quando um pequeno me calca.
"Estás zangada?"
Fico bem se deres a mão. Se me lembrares de como se anda em cima dos muros.

terça-feira, março 09, 2004

"Lá no alto, num ramo firme
arqueia-se uma gralha negra toda molhada
arranjando e voltando a arranjar as penas à chuva.
Não espero qualquer milagre
nem nada

que venha lançar fogo à paisagem
no interior dos meus olhos, nem procuro
mais no tempo inconstante qualquer desígnio,
mas deixo as folhas manchadas cair conforme caem,
sem cerimónia ou maravilha.

Embora - admito-o - deseje
ocasionalmente alguma resposta
do céu mudo, não posso honestamente queixar-me:
uma certa luz pode ainda
surgir incandescente

da mesa da cozinha ou da cadeira
como se um fogo celestial tornasse
seu, de um instante para outro, os mais estranhos objectos,
assim consagrando um intervalo
de outro modo inconsequente

por nos dar grandeza e glória,
ou até amor. De qualquer modo, caminho agora
atenta (pois isso podia acontecer
mesmo nesta paisagem triste e arruinada); descrente,
mas astuta, ignorante

de que um anjo se decida a resplandecer
repentinamente a meu lado. Apenas sei que uma gralha
ordenando as suas penas negras pode brilhar
de tal maneira que prenda a minha atenção, erga
as minhas pálpebras, e conceda

um breve repouso com medo
de uma neutralidade total. Com sorte, viajando teimosamente por esta estação
de fadiga, acabarei
por juntar um conjunto

de coisas. Os milagres acontecem
se gostares de chamar àqueles espasmódicos
jogos luminosos de milagres. A espera recomeçou de novo,

a longa espera pelo anjo,
por essa rara, fortuita visita."

(SYLVIA PLATH, a gralha negra em tempo de chuva)

segunda-feira, março 08, 2004

A minha mãe fez mousse de caramelo "para comemorar o dia internacional...".
O meu pai gostou muito.

sábado, março 06, 2004

"Removi o contador, calei os comentários, e no entanto, o "eco" da minha voz continua a chegar tão pretensioso quanto sempre. Leio-me a mim mesmo pretensioso, de template pretensiosa, com posts pretensiosos, com tudo e mais alguma coisa pretensiosa. Em boa verdade, um blog verdadeiramente despretensioso é um blog calado."
You are so right.

Cessam as casas. Cessam os prazos. As horas. As sms pontuais. Os "até logo". Cessam as despedidas breves.
Os espaços são remotos. As palavras acasos. Ocasos.
Cessam quanto eram finitos.
E começam os sonhos. (Era de esperar....)

quarta-feira, março 03, 2004

Agora sou eu.
Amanhã serei outra qualquer coisa que inventar. Se me faltar imaginação, permite que desçam os oblíquos barulhos dos pássaros.
Distrai-te.
Eu dou dois passos atrás. Ou sete. Para voltar a ser perfeita.

segunda-feira, março 01, 2004

O numerobis descobriu nas palavras de outros que:
"There are two words
that can open a lot of doors:

PUSH and PULL. "

Pois eu descobri TAM e SEM!!
(Eu sabia que decorar o que dizia nas portas dos cafés da Eslováquia me iria servir para algo. )

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