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domingo, abril 24, 2005

Os sábados começavam de pijama, com o barulho das frutas e animais a entrar em casa cedo.
"Onde estão as laranjas?"
A pequena rodava-lhe a saia, trocava-lhe os passos, passarinhava entre as pernas da avó em busca do saco borbulhado.
"Onde estão as laranjas?"
Desfazia um nó, assustava-se quando encontrava os seus olhos ampliados nos olhos de um coelho, desfazia outro nó, desfazia umas flores, apertava o nariz frente à prata azulada das sardinhas, desfazia outro nó...
"Onde estão as laranjas?"
Os sábados começavam com um sol espontâneo a repartir-se entre os mosaicos da cozinha e os cabelos nublados. De pijama e cheiro a frutas e animais a entrar em casa cedo.
"Não havia hoje..."
Mas ela estendia já a mão contra o tecto girando a laranja que encontrara, em busca de um umbigo.
"Essas não são as de que te falei...As outras têm filhinhos."
Pois não eram. As mais doces traziam um umbigo e duendes a viver nos gomos. Não podiam ser aquelas.
Os sábados começavam com a mãe a ralhar por causa dos pés descalços no mosaico da cozinha. Desfazia um nó do cabelo, suspirava.
"Posso ficar com o coelho para mim?"
"Não."
Olhava uma última vez o silêncio cinzento do bicho, amava-o uma última vez. Os sábados começavam com esse amor. E os pés no mosaico. E os duendes que viviam nos gomos das laranjas que nunca vira.
No sábado em que a avó lhes mostrou as laranjas mais doces, a pequena deixou-as rebolar pela mesa branca. Os duendes não se viam. Deixou-as rebolar pela mesa até alaranjarem o chão de mosaico. Não as quis provar. Desfazia o gomo do sorriso.

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